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Rio Preto se torna um dos principais refúgios de venezuelanos



Quando conseguem atravessar a fronteira com Roraima, os venezuelanos precisam encarar uma nova saga: a de conseguir um lugar para recomeçar a vida no Brasil. E a região de Rio Preto é um dos destinos mais procurados pelos imigrantes no Estado de São Paulo para esse recomeço.

Elsy Sánchez, de 50 anos, é uma entre dezenas de venezuelanas que fugiram da crise do país e desembarcaram no Noroeste Paulista para tentar uma nova vida. O emprego do marido em uma usina de açúcar e álcool na Venezuela teve de ser deixado de lado, após a crise assolar o país.

Atualmente, com o marido trabalhando como pedreiro no Brasil, ela tenta encontrar um emprego para ajudar nas despesas de casa e no sustento dos dois filhos. "Em novembro de 2018, vendi minhas coisas para sair da Venezuela. Na época, já estava tendo muita fome e dificuldade. Ficamos três dias para chegar na fronteira. Quando chegamos em Pacaraima - principal ponto de entrada dos refugiados no Brasil - tinham muitos venezuelanos", conta.

Na chegada ao Brasil, a incerteza de qual seria o destino da família. Com ajuda de voluntários, Elsy morou em Manaus (AM) durante oito meses, até que um projeto filantrópico de uma igreja fez a proposta para virem morar no interior de São Paulo. "Chegamos em Rio Preto no ano passado. É uma cidade muito tranquila, bem diferente da Venezuela. Gosto muito de viver aqui, mas sinto saudades do meu país".

O Atlas Temático das Migrações Venezuelanas, produzido pelo Núcleo de Estudos de População da Unicamp, mostra que Rio Preto foi a quarta cidade do Estado que mais recebeu imigrantes fugindo da crise na Venezuela nos últimos dois anos e meio. Ao menos 232 refugiados desembarcaram na cidade, desde abril de 2018. Em toda a região, foram 292 - que estão instalados em Barretos, Bebedouro, Catanduva, Nhandeara, Tanabi e Votuporanga, além de Rio Preto.

Para se ter uma ideia, em dois anos e meio, com o programa federal de interiorização dos imigrantes, Rio Preto recebeu mais do que o dobro de venezuelanos do que nos últimos 19 anos. Foram 232 entre 2018 e 2020 contra 95 entre 2000 e 2019, que deixaram o país por outro motivo, como oportunidade de emprego ou para estudar no Brasil.

Contudo, esse número de imigrantes pode ser ainda maior, já que não inclui os solicitantes de refúgio, ou seja, venezuelanos que ainda aguardam resposta do seu pedido. "Esse espalhamento deles por todo Brasil acontece pelo fato de Roraima não ter condições de receber todas as pessoas. Além disso, existe um plano do governo federal para lidar com essa questão migratória. Para que não haja uma sobrecarga dos serviços de saúde e educação", explicou o cientista político Leandro Lima, do Centro de Estudos das Negociações Internacionais da USP.

A pesquisa da Unicamp também aponta que os imigrantes venezuelanos estão em 23% dos municípios brasileiros, ou seja, em uma a cada cinco cidades do país mora pelo menos um venezuelano. Um dos motivos desse espalhamento é que, desde de 2018, o Ministério da Defesa faz a Operação Acolhida com o objetivo de oferecer assistência emergencial aos imigrantes e refugiados que entram no Brasil pela fronteira com Roraima.

"Existem diferentes modalidades de interiorização, tem uma que é feita com finalidade de emprego, com empresários que demonstram interesse em contratar esses imigrantes, e outra que é feita por entidades sociais, que dizem estarem dispostas a receberem essas pessoas, normalmente, essas são feitas por igrejas", diz Natália Belmonte Demétrio, pesquisadora da Unicamp e coordenadora-adjunta do Observatório das Migrações de São Paulo.

Entre as ocupações mais frequentes dos venezuelanos no Brasil estão: vendedor ou funcionário do comércio, pedreiro ou trabalhador da construção civil, mecânico, encanador, cozinheiro e camareiro. "Eles se destacam nos serviços gerais, que exigem pouca formação escolar e que se pauta na informalidade. Mas uma outra frente de emprego com venezuelanos que está crescendo muito é em frigoríficos. Tanto que se você ver quais são as cidades que mais recebem venezuelanos, a maioria está em municípios agroindustriais, como no Sul do Brasil", explicou Natália.

Nancy Rincones Gamboa é formada em administração de empresas e professora de educação comercial, mas ainda não conseguiu encontrar um trabalho na área de formação. "Estou trabalhando como faxineira no Brasil. No meu currículo coloco minha formação, mas até agora nada", conta.

Com o dinheiro que ganha como faxineira, Nancy ajuda os familiares que ficaram na Venezuela e ainda não conseguiram sair do país. "Consigo mandar dinheiro para a minha família, mas não é sempre que tem faxina".

O estudo mostra que pelos menos três ondas migratórias de venezuelanos chegaram ao Brasil na última década. A primeira, de 2012 a 2014, formada por imigrantes altamente qualificados que, em sua maioria, optaram por viver no Sudeste. A segunda, de 2015 a 2017, foi de venezuelanos de classe média. E a última onda começou a chegar em 2018 - com a crise no país, imigrantes mais pobres enfrentaram dias de caminhada a pé para chegar ao Brasil e fugir da fome.

"Eu tive que sair de lá porque não tinha comida, tudo muito caro. Lá não tem gás, todo mundo cozinhando com lenha. Muitas pessoas morrendo porque não tem hospital. Tenho meu filho mais velho, que ainda está lá e não conseguiu vir para o Brasil. Fico com o coração na mão", diz Elsy.


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